quinta-feira , 21 novembro 2024
Justiça

Indígenas Guarani Kaiowá de Passo Piraju vão a júri nesta semana em processo sobre conflito envolvendo a luta pelo território tradicional

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Indígenas do povo Guarani Kaiowá vão a júri em um processo sobre conflito territorial ocorrido em 2006, quando reivindicavam a demarcação de seu território tradicional. Dezoito anos se passaram do ocorrido. O julgamento conduzido pela Justiça Federal de São Paulo iniciou na manhã desta segunda-feira (26), com previsão de se estender até a próxima sexta-feira (1º).

No banco dos réus Walmir Júnior Savala e Sandra Arevalo Savala, ambas lideranças Guarani e Kaiowá do tekoha Passo Piraju, Terra Indígena Dourados-Amambaipegua III, no Mato Grosso do Sul, acusados de dois homicídios e da tentativa de um terceiro. A comunidade, no entanto, denuncia desde a época dos fatos ter sofrido uma emboscada de policiais à paisana e afirma que os indígenas agiram em defesa do território e do povo. A TI está localizada no município de Dourados, região de Porto Kambira, no Mato Grosso do Sul (MS).

O júri será composto por sete civis. “Eles serão os verdadeiros juízes do caso”, ao longo desta semana, explica Caroline Dias Hilgert, advogada dos indígenas. O julgamento é aberto ao público em geral, uma delegação com dezenas de lideranças Guarani Kaiowá do tekoha Passo Piraju acompanha o júri.

A audiência inicia com o sorteio dos jurados, e na sequência deverão ser ouvidas as testemunhas da acusação. Em seguida, será ouvido a defesa – que neste caso em específico é composta pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), pelas advogadas indigenistas Michael Mary Nolan e Caroline Dias Hilgert e pelo advogado Guilherme Madi Rezende. Só então os indígenas serão ouvidos. 

O caso está ligado ao conflito fundiário envolvendo o território de ocupação tradicional dos Guarani Kaiowá e a Fazenda Campo Belo, que incide sobre o tekoha – lugar onde se é – Passo Piraju.

No período dos fatos, 1º de abril de 2006, Passo Piraju sofreu diversos atentados e ataques, e os indígenas viviam em permanente vigília e ameaçados. O tekoha fica às margens do rio Dourados, de onde com frequência barcos com homens armados faziam disparos contra a comunidade, relatam os indígenas.

Conforme relatos dos Guarani Kaiowá e as notícias da época, policiais à paisana invadiram a aldeia e efetuaram vários disparos de arma de fogo. Vestidos com short e camiseta, foram confundidos com jagunços de fazendeiros. Os Guarani Kaiowá se defenderam e um confronto foi estabelecido. Os indígenas alegam legítima defesa, mas afirmam que os policiais se confundiram e atiraram neles mesmos.

O julgamento de Waldir e Sandra Guarani Kaiowá faz parte de um processo amplo, que foi desmembrado. “Em júri realizado em junho de 2019, comandado pela juíza Andreia Moruzzi, da Justiça Federal de São Paulo, além de declarar inocente o cacique Carlito Guarani Kaiowá e condenar outros quatro indígenas, uma argumentação positiva aos Guarani Kaiowá reconheceu o conflito territorial. Na ocasião, os jurados consideraram que os crimes foram praticados em face do relevante valor social da terra e da comunidade. Portanto, as penas foram diminuídas”, explica Caroline.

Desde a época do conflito, os Guarani Kaiowá aguardam pela demarcação do território, que foi incluído na área de abrangência da TI Dourados-Amambaipegua III. Contudo, desde a abertura do Grupo de Trabalho para a identificação e delimitação da área pela Funai, em 2008, não houve nenhum avanço no processo demarcatório. O relatório circunstanciado de identificação e delimitação da terra indígena ainda não foi publicado, 16 anos depois do início dos estudos.

Sobre o processo

O processo levado a júri corria em Dourados, mas a defesa dos indígenas conseguiu o deslocamento de competência para São Paulo. A Justiça entendeu que no Mato Grosso do Sul existe dúvida sobre a imparcialidade no tratamento da ação judicial. Ao chegar em São Paulo, foi desmembrado em dois para julgamento: os réus detidos e os em liberdade.

No caso dos quatro réus em liberdade, com relação ao processo iniciado em 2006, restaram apenas dois: um deles morreu e outro, um indígena Ofaié, foi impronunciado, ou seja, as acusações contra ele foram consideradas improcedentes.

A defesa dos Guarani Kaiowá é feita pela assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e por procuradores da Advocacia-Geral da União (AGU) com atuação na Funai.

Ao longo da semana o Cimi irá manter postagens diárias sobre o júri em suas redes sociais, no que tem chamado de “Diário de Júri: Passo Piraju”.

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