Após inúmeras pesquisas apontando para a gravidade da hostilidade contra o gênero feminino dentro do universo gamer, a Wonder Women Tech (WWT), ONG e ecossistema global de incentivo e contribuição para a inclusão feminina no mundo da tecnologia, apresenta a primeirae-delegacia exclusiva para mulheres, para denúncias reais em uma plataforma gamer. A partir de agora, as jogadoras encontram dentro do GTA RP uma nova ferramenta beta que facilitará o acesso à informação e o direcionamento das jogadoras às plataformas oficiais de registros de ocorrências para denunciar situações de assédio, ameaças, constrangimentos e violências diversas.
Em 2023, a Sky Broadband, uma das maiores companhias provedoras de internet do Reino Unido, realizou uma pesquisa e detectou que 49% das mulheres gamers já sofreram algum tipo de assédio enquanto jogavam ou transmitiam lives desse universo na internet, e que 27% temem que esses ataques ameacem a própria vida. Outro número ainda mais impactante é que uma em cada dez entrevistadas cogitaram tirar a própria vida após violências diversas – online.
“As vozes das jogadoras femininas têm sido sufocadas pelo assédio e violência, e a Wonder Women Tech atende ao chamado pela mudança. Lançar uma estação de e-polícia não é apenas uma inovação; é uma declaração de que a era do silêncio e do medo acabou. Merecemos nos sentir seguras”, diz Lisa Mae Brunson, Fundadora da Wonder Women Tech.
“Esta ferramenta é mais do que uma funcionalidade – é um escudo, uma declaração e um passo adiante. Ela incorpora nosso compromisso em transformar o mundo dos jogos em um espaço de segurança, respeito e igualdade. Juntos, não estamos apenas jogando; estamos estabelecendo novas regras, exigindo responsabilidade e criando uma comunidade inclusiva onde todo jogador, independentemente do gênero, pode prosperar. O jogo está mudando, e nós somos os agentes da mudança”, adiciona Brunson.
‘E-Police Station’: Do videogame para a vida real
Há alguns anos, o GTA RP já conta com delegacias convencionais, utilizadas exclusivamente como parte do enredo. Por meio de uma MOD (modificação) no código aberto do game, somada à parceria com um servidor, o mapa ganha a ‘E-Police Station’ (e-delegacia, em português), uma estação de polícia idêntica a do mundo real, especialmente para mulheres. A recomendação é que uma jogadora, ao sofrer ou presenciar situações de violências diversas, salve as provas dentro da própria plataforma gamer. Na sequência, o avatar digital deve seguir até esse ponto de apoio, onde um totem será aberto e instruirá o registro de um boletim de ocorrência eletrônico dentro do site oficial da polícia, sem a necessidade de sair do jogo. Ao finalizar o preenchimento, as informações seguirão os trâmites normais de apuração das ocorrências, pelas autoridades oficiais.
Enquanto as mulheres abandonam o jogo e chegam até a pensar em suicídio, os assediadores seguem impunes. A e-Police Station é uma modificação simples dentro do game, que pode mudar essa dinâmica já que facilita e estimula a realização de BOs. Sem sair do jogo. E que, por ser código aberto, pode ser usada por quem se interessar. “As agressões são individuais, mas a luta é coletiva”, comenta Deborah Vasques, Diretora de Criação da AlmapBBDO.
A proposta de colocar uma e-delegacia dentro do jogo eletrônico nasceu justamente a partir da urgência em culpabilização de agressores, que costumam se ver em zonas sem lei dentro do universo online. Inclusive, uma prática muito comum era de os jogadores serem banidos, criarem um usuário e seguir praticando assédio de forma impune.
Lisa Mae Brunsoncomenta que muitas vítimas deixam de denunciar seus agressores por enxergar impunidade dentro desse território. Agora, com a nova ferramenta, qualquer jogadora ao sofrer algum tipo de violência conseguirá documentar o incidente e realizar um boletim de ocorrência sem sair do jogo, tendo um canal de ajuda para repreender a violência, enquanto os responsáveis serão julgados e punidos de acordo com a justiça – dentro e fora das telas.
Ciberativismo cresce entre as mulheres
Diversas organizações sem fins lucrativos, e empresas, defendem a ferramenta de ciberativismo como meio de impactar a impunibilidade dos assediadores por trás das telas. Para Brunson, usar o canal de agressão com o intuito de mobilização, reeducação e corretivo, tem sido uma maneira que as mulheres têm explorado mais recentemente.
“Este é um ponto de virada, um momento em que dizemos ‘chega’ e nos unimos para proteger a alegria, a criatividade e a comunidade que os jogos trazem para nossas vidas. Nossa mensagem é clara: estamos observando, estamos agindo e estamos mudando o jogo para as mulheres em todos os lugares”, diz Brunson.
Brasil enquanto precursor da proteção de mulheres gamers
Segundo dados da Pesquisa Gamer Brasil (2022), o Brasil ocupa a quarta posição no ranking da América Latina no consumo de jogos eletrônicos, e 51,5% desses consumidores são mulheres, um fator determinante para a escolha do país para pilotar o projeto – que está em fase beta.
Somado ao volume de jogadoras online, outras duas questões que impactaram na decisão do local foram os números alarmantes sobre violência feminina, que de acordo com pesquisa do ano passado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública aponta para 50 mil vítimas de assédio por dia, um estádio de futebol lotado; e o fato do país ser o pioneiro na instituição de delegacias especializadas em mulheres na América Latina, criadas em 1985, multiplicando-se com base em uma logística e legislação estadual.
Ferramenta global
A ONG ainda avalia a possibilidade de propagar essa funcionalidade em outros jogos e países para um futuro de médio prazo. E, pensando em agilizar essa multiplicação no número de servidores com essa ferramenta, o código de implementação será disponibilizado de forma gratuita e aberta na página oficial.
Por se tratar de uma funcionalidade inicialmente com campo de atuação no Brasil, que é um país com delegacias dedicadas a crimes de violência contra a mulher, para o público de outras nacionalidades será necessário alterar a programação reendereçando a página de denúncias para o órgão competente e de atuação no país específico.
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