quinta-feira , 9 maio 2024
Conflitos

Autorizações para saída pela fronteira do Egito prioriza países aliados de Israel, diz analista

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Telefonemas, troca de mensagens e um intenso trabalho da diplomacia do Itamaraty visam assegurar que brasileiros finalmente integrem a próxima relação de pessoas autorizadas a cruzar a fronteira do sul de Gaza com o Egito.

A promessa dada ao governo por autoridades egípcias, que não são os principais árbitros nessa questão, é de que o grupo de 34 pessoas passe pelo portão de Rafah até quarta-feira. Porém, a suspensão das travessias nesse sábado deixou uma multidão apreensiva.

A brasileira Shahed al Banna foi até os guardas que fazem a vigia do local para saber se as informações que circulavam sobre a suspensão das autorizações de saída eram verdadeiras.

“A gente acabou de perguntar e disseram para gente isso mesmo, que ninguém saiu nesse sábado, nem gringos, nem feridos, nem nada. É porque parece que eles não estão permitindo que feridos saiam e sejam atendidos nos hospitais do Egito. Espero que a gente saia daqui logo”, disse a jovem de 18 anos em um vídeo.

A notícia de que a operação de travessia havia sido interrompida gerou especulações de que, atendidos os pedidos de países como Estados Unidos e Reino Unido, cidadãos de outros países que aguardam a liberação não teriam mais resposta das autoridades responsáveis.

Depois circularam informações atribuídas ao governo americano de que a suspensão se devia ao fato de que o Hamas estava tentando garantir a passagem de terroristas feridos incluídos em listas que apresentou nas negociações.

Estimativas apontam para um milhão de pessoas que deixaram outras áreas de Gaza e se concentram no sul da região buscando a passagem pelo Egito. Um avião da FAB já está de prontidão no Cairo para o resgate de brasileiros palestinos e seus parentes, que foram incluídos na lista do Itamaraty, assim que eles receberem o aval para cruzar a fronteira. Essa autorização está sendo analisada por Israel, Egito, Estados Unidos e Catar.

“São esses os países que estão diretamente envolvidos na construção das listas de pessoas autorizadas a deixar Gaza. Fazem-no em consulta com outros países e organizações políticas, inclusive, obviamente, o Hamas. Os critérios não são claros nem estáveis, pois há espaço para negociações ao sabor das avaliações que eles fazem das circunstâncias políticas e das posições adotadas pelos interessados em evacuar seus nacionais. Portanto, a demora em liberar a saída de brasileiros provavelmente está relacionada com a posição equilibrada e construtiva que o Brasil vem adotando publicamente”, afirmou à RFI Jorge Ramalho, analista internacional e professor da Universidade de Brasília.

Preferência por outros países

As informações são de que Israel tem um peso crucial na liberação de pessoas na fronteira e a posição que o Brasil tem apresentado no conflito, de condenar os ataques do Hamas, mas também a reação bélica israelense, ajuda a entender a demora em acolher o pedido dos brasileiros.

“Levando em consideração as quatro listas que já foram divulgadas, é possível constatar que o governo de Israel tem dado preferência a países com uma aliança mais próxima a ele. E aí eu enfatizo Estados Unidos e Inglaterra, já que, nessas quatro listas, os cidadãos americanos e britânicos têm sido contemplados quase que totalmente. Então parece sim que houve uma preferência dada por Israel a partir de boas relações bilaterais e, principalmente, a partir do comportamento dos países em toda essa crise”, afirmou à RFI o professor de Relações Internacionais da PUC/SP, David Magalhães.

“Quando a gente exclui Europa Ocidental e Estados Unidos, aí a gente encontra outras nacionalidades, por exemplo, o México, que tem tido um comportamento bem equidistante, como o Brasil. E apareceu na lista também a Indonésia, que historicamente tem sido crítica à política externa israelense. Mas pela quantidade parece que houve uma prioridade sim para os países que estão cerrando fileiras com Israel nesse confronto com o Hamas. E muito provavelmente nas próximas listas, os países com uma posição mais equidistante, que é o caso do Brasil, devem ser contemplados”, projeta Magalhães.

Horizonte sem paz

Os dois analistas ouvidos pela RFI dizem que não há como prever hoje até quando irá a guerra em Gaza, apesar de ter crescido o coro de autoridades em prol de um cessar fogo, em razão do número e das chocantes cenas de civis mortos.

“Quanto mais a gente se distancia do 7 de outubro, quando houve uma legítima comoção em relação ao massacre bárbaro do Hamas, mais a gente se depara com o conjunto de barbaridades e de crimes de guerra de Israel, atingindo o Hamas, mas também civis, famílias, crianças. Macron, por exemplo, já está defendendo com maior entusiasmo um cessar fogo. Joe Biden agora pediu explicações ao ataque que aconteceu no campo de refugiados em Gaza. Está aumentando a pressão sobre Netanyahu por um cessar fogo, mas o fim do conflito é imprevisível. O que a gente pode dizer é que não está perto”, afirmou o professor da PUC/SP.

Fim imprevísivel

David Magalhães avalia ainda que há uma cortina de fumaça nas intenções de Israel nesse contra-ataque, o que torna difícil prever seu fim. “Isso se deve em parte ao fato de o próprio governo de Israel ter se mostrado bastante ambíguo em relação aos objetivos dessa guerra. Parte de seu governo e o próprio Netanyahu disseram que o objetivo é eliminar o Hamas, mas você tem outras informações que foram divulgadas, por exemplo, naquele documento que foi vazado do serviço de inteligência, que aponta para outros objetivos, como expulsar os palestinos de Gaza, levando-os para a Península do Sinai, no Egito”.

O analista Jorge Ramalho destacou que os intensos bombardeios de Israel sobre Gaza podem matar os próprios reféns israelenses que estão nas mãos do Hamas. “A julgar pelas declarações oficiais de seu governo, contudo, isso não tem importância nisso para o governo israelense. Netanyahu chegou a dizer que civis são vítimas mesmo nas guerras mais justas. Essa reação alimenta o conflito em sua raiz, servindo apenas ao interesse dos radicais e intolerantes, a começar pela extrema-direita que hoje governa Israel e os mais radicais combatentes no Hamas. No atual processo, ambos são cúmplices no conflito e no cometimento dos crimes de guerra que hoje chocam quem tem algum sentido de humanidade”.

O professor da UnB também afirmou que só vê uma solução para a região se houver um esforço internacional em prol dos dois estados. “A solução não será militar, mas política, baseada na construção de dois Estados viáveis social, política e economicamente. Só se pode contemplar tal encaminhamento com uma intervenção equilibrada e prolongada da comunidade internacional”. (fonte:www.rfi.fr/br)

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