“Aos católicos chineses, peço-lhes que sejam bons cristãos e bons cidadãos”, ele acrescentou. Estes comentários, não previstos no discurso oficial, parecem marcar uma nova tentativa do Papa de tranquilizar o governo comunista chinês.
Pequim desconfia de qualquer organização, especialmente religiosa, que acredita poder ameaçar sua autoridade, e não mantém relações diplomáticas com a Santa Sé. No sábado (2), o sumo pontífice já tinha parecido enviar uma mensagem à China, sem identificá-la explicitamente: “Os governos e as instituições seculares não têm nada a temer da ação evangelizadora da Igreja, porque esta não tem nenhuma agenda política”.
Com esta visita papal sem precedentes à Mongólia, uma nação sem litoral entre a China e a Rússia, Francisco tinha dois objetivos: visitar uma região remota onde o catolicismo é recente e ainda pouco difundido, e aproveitar sua presença às portas da China para estabelecer laços com Pequim.
Muitos peregrinos chineses foram à Mongólia, enfrentando o risco de represálias no seu país. Foi “muito difícil vir aqui”, relatou uma mulher chinesa de Xi’an (norte), que não revelou seu nome, no meio da multidão que veio assistir à missa neste domingo. Ela contou que os dois organizadores da peregrinação do seu grupo foram presos na China.
“Admito que tenho vergonha de agitar a bandeira nacional [chinesa]”, acrescentou ela. “Mas tenho que aguentar e deixar o Papa saber o quão difícil é para nós.”
“Bayarlalaa!”
Neste domingo, o Papa mostrou seu apoio à modesta comunidade católica da Mongólia – de 1,4 mil membros, incluindo 25 padres, em um país com cerca de 3 milhões de habitantes – celebrando uma missa em uma arena de hóquei no gelo recentemente construída na capital Ulan Bator.
Ao final, Francisco lançou um “bayarlalaa!” – “obrigado” na língua mongol – aos seus “irmãos e irmãs da Mongólia”.
No início do dia, o Papa se encontrou com dez líderes religiosos no pequeno teatro Hun, similar a uma tradicional tenda mongol. Representantes do budismo e do xamanismo – as duas crenças maioritárias na Mongólia – bem como do islamismo, do judaísmo, do hinduísmo e da Igreja Ortodoxa Russa estiveram presentes.
“Estarmos juntos no mesmo lugar já é uma mensagem: as tradições religiosas, na sua originalidade e diversidade, representam um grande potencial para o bem ao serviço da sociedade”, afirmou o Papa jesuíta.
Citando Buda e Gandhi, ele apelou “aos líderes das nações” para que escolham “o caminho do encontro e do diálogo com os outros”. O Papa deve deixar a Mongólia ao meio-dia de segunda-feira (4).
“Solidariedade da humanidade”
Sua visita “prova a solidariedade da humanidade”, declarou Natsagdorj Damdinsuren, chefe de um mosteiro budista na Mongólia. “Sou apenas um humilde monge budista, mas, para mim, a guerra e o conflito são os acontecimentos mais trágicos do nosso tempo. Acho que outras religiões concordam comigo”, continuou.
Ao assistir à missa, Nomin Batbayar, uma estudante mongol de 18 anos, saudou o Papa como “uma pessoa verdadeiramente autêntica, e é por isso que há 1 bilhão de pessoas no mundo que acreditam nele e o apoiam”. “A China não o apoia realmente, mas o seu povo está lá hoje”, observou ela.
Na missa, uma mulher chinesa da província de Hebei, no norte, disse que se sentiu “abençoada” por ver o Papa. “Ter nossa própria religião não significa que estejamos contra nosso país”, acrescentou ela. “Na verdade, estamos orando por nosso país.”
A liberdade religiosa na Mongólia, um país que se tornou democrático em 1992, contrasta com a situação na vizinha China, onde a prática continua a ser dificultada. Mas isto não impediu o governo chinês e o Vaticano de renovarem um acordo no ano passado sobre a espinhosa questão da nomeação de bispos, criticada por alguns como uma concessão perigosa da Santa Sé em troca da sua presença no país.
“Ao mundo inteiro”
Questionado sobre as aparentes referências a Pequim no discurso do Papa, o bispo de Hong Kong, Stephen Chow, garantiu que a mensagem do pontífice se destinava “ao mundo inteiro”. “A Igreja atualmente (…) realmente não tem intenção de se tornar política e isso é importante para nós”, avaliou ele. “Caso contrário, perderemos nossa credibilidade como instituição que fala de amor e de verdade.”
Ao chegar a Ulan Bator na sexta-feira (1°), Francisco elogiou a “sabedoria” da Mongólia e dos seus habitantes, mas se mostrou preocupado com a corrupção e a poluição, dois males que corroem o país. (Com informações da AFP)
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